Morte, esta carta é para ti.
Temo, entro em pânico só de pensar no ato de morrer, como sendo um término do meu corpo. Entro em respirações tépidas só de pensar que deixo de Ser. O rumo muda. Pensamentos me invadem a mente. Sabes que há diferentes formas de morrer? Posso ter controlo nas decisões da minha vida, mesmo no seu fim de ciclo? Será que realmente é um final? Morte, esta carta é para ti. Já te senti tão perto de mim. Entre a cama do Carlos, os risos Tânia, o choro das amarras do Albano como os poemas escritos pelo António. As suas vidas guardo memória, mas as suas mortes vivas ainda se encontram. Como perguntei por ti. E pensei que estarias para mim, entre surtos e gritos em silêncio passaste na minha mente sem fim. Ao te admitir abraço-te. Não que o queira, mas porque me obrigaste. O meu corpo sentiu-te e um vulto de formas como chegar a ti surgiram. O abismo de te conhecer cruzou-me entre sinapses, mas entre os dedos escorregaste-me. Parece que o ciclo da vida ainda não te quer tão perto de mim. Não faz mal, não te preocupes. Um dia hei-de chegar a ti, mas não entre surtos corporais sem controle que chamam por ti. Termino esta carta para referir que quero ser uma árvore. Deixar algo em continuidade. Uma semente que é regada e nutrida pela degradação do meu corpo entre a terra que a envolve. Não para ser uma outra canção, mas para chegar à verdade absoluta, contemplativa. Às raízes do meu Ser e aceitar. Aceitar que quero abraçar. O agora. O presente com a necessidade permanente de criar um canal. Uma estrada. Uma esperança. Pensar que há um lugar que possa continuar este ciclo, a vida. Viver. Obrigada Morte, porque sem pensar em ti, não estaria aqui.